sábado, 6 de fevereiro de 2016

Brasilidade milenar

"Meu choro não é nada além de carnaval
É lágrima de samba na ponta dos pés."


     Eleita nessa semana pela BBC como "a melhor cantora do milênio" e descrita pela Time Out como “uma mistura explosiva de Tina Turner e Celia Cruz”, Elza da Conceição Soares, mais conhecida como Elza Soares, prova que o clássico pode se renovar sem necessariamente perder a qualidade. A feminista assumida de feição felina, emoldurada pelo afro volumoso coroado de flores, sorriso largo e rasgado, sobrancelhas arqueadas, e eloquência curta e grossa,transmite força em meio a melancolia, liberdade e sofrimento dos seus sambas, que já vem inspirando e conquistando corações há três gerações. Mesmo após 60 anos de carreira musical a brasileiríssima lançou em 2015 “A Mulher do Fim do Mundo”, album cujos temas principais são: a violência contra a mulher, negritude, morte e sexo. 
   Conheça "A mulher do fim do mundo" onde a Negra Elza (de)clama a capella um poema da obra "O santeiro do mangue e outros poemas"do grande Oswald de Andrade, abrindo assim, as feridas da fila de cicatrizes musicadas: 

Coração do mar
É terra que ninguém conhece
Permanece ao largo
E contém o próprio mundo
Como hospedeiro
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"
Tem por nome "Se eu tivesse um amor"

Tem por bandeira um pedaço de sangue
Onde flui a correnteza do canal do mangue
Tem por sentinelas equipagens, estrelas, taifeiros madrugadas e escolas de samba

É um navio humano quente, negreiro do mangue
É um navio humano quente, guerreiro do mangue
Oswald de Andrade




Entre uma faixa ou outra a voz rouca, quase falha da rainha do samba fuxica as dores já vividas pela compositora ao longo da vida cheia de bossa e leva os pés sofridos e cansados a contrabalançarem no ritmo da sofreguidão de histórias repletas de sambalanço e brasilidade, mostrando que se depender dela o morro vai sambar eternamente, pois o samba engajado nunca vai acabar. 

Scarleth Menezes

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